José Dirceu e a memória curta do Brasil

Mais uma vez, o Brasil prova que tem memória seletiva, curta e muitas vezes indulgente. José Dirceu, ex-deputado federal, ex-ministro da Casa Civil, protagonista de alguns dos maiores escândalos políticos da nossa história recente, volta a ocupar espaço na imprensa como se fosse uma figura de referência, um analista respeitável da política nacional. É impressionante como parte da mídia, que deveria ter a responsabilidade de contextualizar fatos e lembrar a sociedade do histórico dos seus personagens, insiste em dar palco a quem tanto contribuiu para corroer a confiança nas instituições.

Estamos falando de um homem que foi condenado no escândalo do mensalão, que teve papel decisivo no esquema de corrupção que manchou o PT e o próprio governo Lula. Mesmo assim, ele ressurge em entrevistas, artigos, análises políticas, como se fosse apenas um veterano da política e não alguém marcado por um prontuário de escândalos.

A pergunta que se impõe é: que país é este em que condenados pela Justiça, figuras centrais de um passado tão nebuloso, ainda encontram espaço para ditar opinião e participar da arena pública como se nada tivesse acontecido? É um retrato da nossa fragilidade democrática, da falta de memória coletiva e da conivência de uma parte da imprensa com o esquecimento conveniente.

José Dirceu se apresenta hoje como conselheiro, estrategista, voz ativa nos bastidores. Mas o que ele representa de fato é um Brasil que insiste em não aprender com os seus erros. Não se trata de negar que qualquer cidadão tem direito à sua defesa, à sua liberdade após cumprir penas, mas há uma diferença enorme entre exercer direitos individuais e ser tratado como uma autoridade moral ou política.

É essa indulgência que preocupa. O eleitor esquece, a sociedade relativiza, a imprensa muitas vezes finge não ver. E assim seguimos, repetindo os mesmos erros, celebrando personagens que deveriam ser apenas notas de rodapé de uma história que gostaríamos de superar.

No fim, Dirceu é apenas o retrato de um país que normaliza a corrupção, que convive com a impunidade travestida de protagonismo político. O problema não é só ele. O problema somos todos nós, que aceitamos isso como se fosse normal.