Emendas para clubes: o gol contra pago pelo povo

No Brasil, a criatividade política para gastar o dinheiro do contribuinte não tem limites e quando se mistura futebol com verba pública, o resultado costuma ser um escândalo travestido de boa intenção. Levantamento recente mostrou que 31 clubes de futebol receberam recursos de emendas parlamentares, vindos de deputados e senadores que juram de pés juntos estar “incentivando o futebol feminino” e “criando oportunidades para jovens em escolinhas”.

No papel, parece nobre. Na prática, é quase sempre propaganda enganosa. Poucos desses projetos têm acompanhamento real. Escolinhas não funcionam como prometido, categorias femininas recebem atenção mínima e, muitas vezes, o dinheiro vai parar na estrutura do time profissional aquele que disputa campeonato masculino, paga salários milionários e ainda cobra ingresso da população.

Nessa lista, aparecem nomes de todos os matizes ideológicos: Renan Calheiros, Soraia Thronicke, Nikolas Ferreira e outros tantos que, curiosamente, discordam de tudo no plenário, mas se entendem perfeitamente quando o assunto é mandar verba para um clube de futebol. A coincidência é que, em vários casos, esses clubes receberam mais dinheiro do que os próprios municípios que deveriam ser prioridade. Escola sem professor? Posto de saúde sem remédio? Estrada esburacada? Deixa pra depois o futebol “precisa” mais.

Esse desvio de prioridades revela um país viciado em populismo e com uma relação doentia com o futebol. Parlamentar sabe que o clube local é vitrine, rende foto, rende camisa personalizada e um discurso fácil de “apoio ao esporte”. E o contribuinte, que paga a conta, é deixado com a sensação de que vive num roteiro repetido: promessas de desenvolvimento social que terminam no caixa do time da cidade.

O futebol é paixão nacional, mas não pode ser desculpa para enterrar recursos que deveriam estar salvando vidas e mudando realidades. O incentivo ao esporte é importante mas só é legítimo quando é transparente, fiscalizado e cumpre exatamente o que promete. Fora disso, é apenas mais um gol contra. E, como sempre, quem fica no prejuízo é o torcedor que não está nas arquibancadas: o cidadão comum.

Que país é este? O mesmo de sempre: o da esperteza, onde o placar final é governo 1 x povo 0.