Circulando pelas ladeiras históricas e pelas comunidades esquecidas de Olinda, o que salta aos olhos não é o brilho do patrimônio cultural que encanta o mundo, mas o cinza da lama, o descaso estampado nas calçadas esburacadas e o odor agridoce da mistura de lixo acumulado e promessas não cumpridas.
A cidade que deveria ser vitrine do turismo, orgulho da cultura pernambucana, parece estacionada num passado que insiste em não dialogar com o presente. São ruas tomadas por crateras que mais lembram cenários de guerra, bairros inteiros convivendo com obras inacabadas quando não abandonadas e um cotidiano marcado pela desorganização e pela ausência completa do poder público.
Fiz questão de percorrer pessoalmente diversos bairros. De Casa Caiada a Peixinhos, do Alto da Sé ao Varadouro, o retrato é o mesmo: buracos que viraram parte da paisagem, lixo em alguns pontos que se acumula como se fosse adorno urbano, e moradores cansados não só do abandono, mas de ouvirem as mesmas promessas recicladas eleição após eleição.
Olinda não sofre de um problema recente. É um colapso anunciado, que vem se arrastando há décadas e que os gestores insistem em maquiar nos períodos de festa. Durante o Carnaval, a maquiagem é aplicada com pressa: limpam-se as vias centrais, pintam-se algumas paredes, colocam-se placas bonitas com palavras como “respeito”, “cultura” e “acolhimento”. Mas é só a folia passar que tudo volta ao caos habitual.
A cidade que poderia ser modelo em preservação, mobilidade e inclusão social, segue sendo um exemplo do que não fazer com um tesouro urbano. É revoltante ver como Olinda patrimônio mundial da Unesco vem sendo tratada como um bairro esquecido da periferia, sem projeto de futuro, sem cuidado com o presente.
Fica o lamento, mas mais que isso: fica o apelo. Aos governantes, que saiam dos gabinetes refrigerados e caminhem pelas ruas que o povo pisa. Aos vereadores e lideranças, que larguem o palanque e olhem nos olhos de quem mora em locais onde o esgoto escorre a céu aberto. E à população, que nunca perca a capacidade de cobrar, de exigir, de lutar por uma cidade que esteja à altura da sua história.
Olinda resiste. Mas até quando ela vai suportar tanto descaso?